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E, desta forma, Joe pensava estar equilibrado. Constatou que acordava todas as manhãs, à mesma hora e que adormecia todas as noites à mesma hora. Constatou que todos os anos passava, com a familia, as mesmas férias, nos mesmos sítios. Joe tinha muito orgulho na sua estante, onde guardava os seus registos. Cada vez que pagava uma conta, colocava-a na estante. Sempre que tirava fotografias à família, com esses aparelhos de que os humanos dispõem, colocava-as na estante... camada sobre camada, reflectindo os anos e anos de monotonia. Joe sobrevivia. Enquanto conseguisse continuar a equilibrar o seu "interior" com o "exterior", Joe estava feliz.
E, então, vieram as tempestadas magnéticas, as tempestades do Espírito na nova energia. Houve água, houve frio, houve calor. A Terra tremeu e tudo aquilo que se encontrava nas prateleiras de Joe caiu no chão e ele teve medo, porque a mudança foi grande. E, por um momento, verificou que o "interior" poderia não se harmonizar com o "exterior".
No entanto, Joe, que era um homem íntegro, apressou-se a ajudar os vizinhos, antes de se ajudar a si próprio. E passou três dias inteiros a ajudá-los, porque estavam mais necessitados do que ele. Assim que tudo ficou concluído, Joe e a família regressaram a casa. E, então apercebeu-se de uma coisa: tinha conhecido pessoas que, desde sempre, viviam ao seu lado. Soube os seus nomes e viu as suas caras. Constatou que as pessouas eram muito parecidas consigo e que as amava. Viu que havia camaradagem, que se tinham ajudado umas às outras e que cada uma tinha uma lembrança para ele, algo de que nãoe stava à espera: um pouco de , discernimento, um abraço... e algum amor. E Joe apercebeu-se, então, dos anos que tinha desperdiçado não compreendendo, nem sabendo nada sobre os seus vizinhos. Joe sentiu-se, de alguma forma, modificado por este acontecimento. Soube que voltaria a vê-los e, para tal, marcou encontros.
Joe deu ínicio à tarefa de pôr em ordem a confusão em que se encontrava a sua casa. Todas as coisas que tinham estado arrumadas na estante, estavam caídas no chão. Estranhamanete, Joe deu consigo a deitar fora muito do que ali se encotnravae a voltar a arrumar na estante apenas uma percentagem dos artigos que ali houvera. O que, ao princípio, lhe fez muita confusão, mas depois se tornou óbvio, foi o facto de todas as coisas que ía apanhando do chão terem o mesmo aspecto. Até o valor das facturas era o mesmo, ano após ano, só as datas tinham mudado. Olhou para as suas fotografias, ao apanhá-las, e colocou-as nas prateleiras. A única diferença que encontrava era o envelhecimento do rosto. Joe apercebeu-se, então, do que tinha acontecido: ele tinha passado a maior parte da vida em comprazimento, receando mudanças, não vivendo, plenamente, a vida. Tomou consciência de que tinha perdido muita coisa, que tinha perdido muito amor. Apercebeu-se de que a rotina e a tuo-satisfação não eram coisas boas, que o medo não era uma coisa boa. Subitamente, Joe compreendeu que tinha mudado.
E, então, reuniu a família para lhe falar da sua mudança, para lhe dizer que não deveria temer o que acontecera, porque graças a si mesmo e aos vizinhos, iriam ultrapassar a situação.
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Muito se fala actualmente do despertar espiritual, do ser renascido, do pensar da nova era. Sei lá! São tantas as expressões que tu usas, que eu uso, e que ouvimos daqui e dali um pouco.
E na verdade, para concluir, o quê. E qual a razão deste texto?
Por isto. De uma forma geral, os seres humanos, têm tido que passar por perdas, umas maiores, outras menores, mas geralmente, perdas, para perceberem que há mais do que a sua vidinha quotidiana, que a sua vidinha certinha e sem graça. Do que a sua vidinha em que tudo está bem porque se mantém bem, mesmo que já esteja farto, cansado, entediado desta monotonia. Por outro lado, o desejo. O desejo de mudar, de fazer não sabem bem o quê, de arriscar, de inventar, de criar.
E por fim, a matriz. A matriz de controlo que os mantém seguros no lugar em que estão. Controlados pelo medo.
Medo de mudar, de perder, de crescer.
Medo do desconhecido, do que está para além do véu (tenho a sensação que já escrevi sobre isto)...
E um dia, apesar dos imensos estimulos, oportunidades e vontades de mudança, que não surtem qualquer resultado, "catrapumba", a vida atira-lhes com perdas, obriga-os a desfazerem-se de coisas, a desapegarem-se de pessoas, a darem valor ao que têm, a aumentar a baixa auto-estima que sempre tiveram sobre si próprias... As perdas vêm sob as mais diversas formas: emocionais, de saúde, materiais, etc.
E é nessa altura, que olham para o mundo com olhos de ver, e percepcionam finalmente que são seres divinos e que têm um coração para amar, que na verdade já nem se lembravam que tinham.
Amar aos outros e amar a vida que durante tantos anos desprezaram.
Amar o que é belo, e tudo o que os rodeia.
Perceber que o cheiro das flores emanado por aquela florista onde passavam todos os dias à porta fazia, afinal, diferença no seu dia.
Perceber que ao descer as escadas do emprego, em vez de ir de elevador, lhes mostrou que a mudança ténue de azulejos côr lilás para rosa, em pequenos bafejos de côr, se tornava agradável à vista e ao coração e que aquela simples percepção poderia mudar, uma entediosa subida ou descida de escadas, num momento agradável.
E, afinal, porquê? Porque necessitamos de passar pelas perdas para entendermos que VIDA é muito mais do que aquilo que geralmente fazemos?
Porque nos impômos regras destas, de clausura e retenção, quando o mundo é tão belo e maravilhoso?
Aqui fica um desafio!
Para vocês muita Paz e Luz nos vossos corações.
Excerto de texto extraído do livro 2 de Kryon "Não pense como um humano"